sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Fim de tarde


Esperava sentada no banco da praça há mais de duas horas. Sabia que ele passaria por ali na volta do trabalho. Quantas vezes ficara ali alegremente para encontrá-lo. Mas desta vez o motivo era outro. 

Haviam rompido há três meses. Um dia qualquer tiveram uma briga, sem grandes razões. Declarou o fim. Apenas para provocar-lhe o desespero e o pedido de desculpas. Mas ao contrário do que esperava, ele simplesmente aceitou. Deu de ombros, virou-lhe as costas e bateu a porta ao sair. Não retornou desde então. 

Chorou dias inteiros abraçada às lembranças, fotos e presentes. Não imaginava ser possível tanta infelicidade. Após um mês de luto fechado decidiu que já era o suficiente. A vida teria que seguir adiante. Jogou todos os vestígios do passado amoroso no lixo, arrumou-se e foi trabalhar.

Ao chegar no escritório, recebeu elogios pelo capricho repentino. Alguns se disseram aliviados que ela também já tivesse superado o fim do relacionamento. "Também" soou como um martelo de tribunal, estava dada definitivamente a sentença. Namorava outra, estava feliz, não sofrera nada. 

Não importava mais. Desejava-lhe o melhor, que fosse feliz. Não era do tipo que guardava rancor. 

Cinco e meia da tarde. Seu coração acelerou quando o viu surgir na esquina. Como estava mudado, bonito, parecia até mais jovem. Sem dúvida estava feliz. Parou surpreso ao vê-la. Com um cumprimento frio e um elogio desinteressado cumpriu a obrigação social. Já estava de costas retomando seu caminho quando ela decidiu que a conversa não havia acabado. 

-Espera! 
-Que foi? 
-Não sentes mais a minha falta? 
-O que?...olha, tenho pressa. Até mais ver... 
-Este tempo todo guardei algo seu comigo.. Algo que fui incapaz de jogar fora. Acho que deveria ficar contigo. 
-O que é? 
-Está na minha bolsa, espera... 

Pôs a mão dentro da bolsa e segurou com firmeza o objeto. Olhou novamente para aquele que tanto amara e por um segundo, amou-o novamente, intensamente. Ergueu a mão em direção ao outro, sem vacilar. 
-Meu deus! Enlouqueces-te! 
-Acredito que esta bala seja sua, não seria justo mantê-la comigo. 
-Não! 
-Formam um perfeito par, e não permitiria que um casamento como este não se realizasse. Adeus, meu querido. Escreva uma carta e conte-me como se ama na próxima encarnação... 
-Ah...!

O barulho do disparo foi tão forte quanto o estalar dentro do peito. Andou até o corpo sem vida e guardou para si aquela expressão de morte. Agora sim o passado seria enterrado. E que gosto estranho e doce sentia entre os lábios. 

Ergueu o olhar e o sol poente cegou-lhe por um instante. Retornou do devaneio. Já passava da hora que ele retornaria do trabalho. Não apareceu. Talvez estivesse doente. 

Levantou e tomou o rumo de casa. A cada passo dado desejava sentir novamente aquele doce sabor. Quantos pequenos assassinatos o sofrer do amor nos leva a cometer mentalmente? Muitos...ah muitos...

2 comentários: